Tornai as vossas vidas lugares de Beleza

Tornai as vossas vidas lugares de Beleza

"Fazei coisas belas,
mas sobretudo tornai as vossas vidas
lugares de beleza
".
Foi com esta exortação que Bento XVI terminou o seu discurso no Encontro que teve com uma assembleia de participantes do mundo da cultura, aquando da sua visita a Portugal, no passado mês de Maio. Palavras dirigidas não só aos artistas, mas também a cada um de nós discípulos do Mestre, o mais Belo dos Filhos dos Homens.
Chamados a conformar a nossa vida com Jesus Cristo somos, por isso, convidados a colocarmo-nos à Sua disposição, qual barro nas mãos do Artífice, para que Ele modele, retoque e dê beleza ao nosso ser. Só assim é possível fazer da vida um lugar de beleza, ser presença de Deus e viver em comunhão com Ele, que é Beleza Infinita. Só assim é possível criar beleza com a nossa própria vida, uma beleza que permeabilize o nosso quotidiano, os nossos gestos e as nossa atitudes. Uma beleza que nos mova à descoberta constante da Verdade do Ser, do Bem em Si, e nos lance no abraço ao Irmão, à dignificação do ser humano, à produção de sentido do presente e do futuro.
Chamados à beleza, na “conquista” da semelhança com o Pai de toda a Beleza, percebemos que não somos o último grito de Deus, mas um ser incompleto na busca desta imagem e semelhança em permanente evolução. E, juntando a nota do nosso ser à pauta do universo, sentimos mais harmonia dentro de nós e maior comunhão com a humanidade e com todas as criaturas. A beleza é essa linguagem universal, que nos faz pensar e ser pensados pelo Criador. É a luz que nos dá lucidez, clarividência, visão clara e abrangente no claro-escuro e no fragmentário em que nos movemos, aos tropeções. A beleza é uma oferta de Vida à vida.
A beleza é como um “doce murmúrio, que fala à nossa alma; mais que uma necessidade, é um êxtase. A beleza é Vida, quando a vida desvenda o seu rosto sagrado. A Beleza é a eternidade que se contempla a um espelho” (Khalil Gibran). Mas só quem se coloca numa atitude de encontro com Deus, é capaz de ler esta realidade bela que nos envolve e nos faz mensageiros do divino. Quando acontece o silêncio em simbiose com o assombro, não temos muito mais para provar a não ser: sentir, viver e anunciar este êxtase do belo que nos rodeia e que está em nós. Descobriremos assim os vários tons da Beleza, já que “Privar-se da beleza é enterrar-se vivo. É negar a nossa própria capacidade de transcendência e de encontro com o Todo” (Gabriel Perissé).
“A Beleza está em toda parte. Não é ela que falta aos nossos olhos, mas os nossos olhos que falham ao não percebê-la” (Rodin) e “O mundo em que vivemos tem necessidade de beleza para não cair no desespero. A beleza, como a verdade, é a que traz alegria ao coração dos homens, é este fruto precioso que resiste ao passar do tempo, que une as gerações e as faz comungar na admiração”(Padres do Vaticano II aos artistas, na Mensagem final).
Neste sentido, evocamos como desafio audaz as profundas palavras de João Paulo II, na sua Carta aos Artistas, em Maio de 1999: “A beleza, que transmitireis às gerações futuras, seja tal que avive nelas o assombro. Diante da sacralidade da vida e do ser humano, diante das maravilhas do universo, o assombro é a única atitude condigna. Os homens de hoje e de amanhã têm necessidade deste entusiasmo, para enfrentar e vencer os desafios cruciais que se prefiguram no horizonte. Com tal entusiasmo, a humanidade poderá, depois de cada extravio, levantar-se de novo e retomar o seu caminho. A beleza é chave do mistério e apelo ao transcendente. É convite a saborear a vida e a sonhar o futuro. Por isso, a beleza das coisas criadas não pode saciar, e suscita aquela arcana saudade de Deus que um enamorado do belo, como Sto Agostinho, soube interpretar com expressões incomparáveis: “Tarde eu Te amei, ó Beleza tão antiga e tão nova, tarde eu Te amei!”

Sexta, 2 de Julho de 2010